“Uma decisão do Tribunal de Justiça inocentou nesta semana um fazendeiro
de Pindorama
(SP) preso em flagrante em 2011 por estuprar uma menina de 13 anos. A alegação
para a absolvição é que a jovem era prostituta e que o réu não sabia que se
tratava de uma menor de idade. O processo corre em segredo de Justiça e a
procuradoria-geral do Estado já anunciou que irá recorrer da decisão dos
desembargadores. O caso aconteceu em 2011, quando o fazendeiro, hoje com 79
anos, foi preso em flagrante com duas adolescentes, uma de 13 e outra de 14,
dentro de sua caminhonete, em uma zona rural da cidade. As duas meninas
disseram à polícia que haviam saído com o fazendeiro para fazer programa, tendo
recebido R$ 50, a mais velha, e R$ 30 a mais nova. Após a prisão, o suspeito
ficou detido por 40 dias e foi liberado.” G1.
Honestamente, não entendo
porque decisões como essas, que isentam de punição pessoas que estupram e
violentam nossas meninas, são tomadas a despeito de todo trabalho que vem sendo
construído no intuito de preservar crianças e adolescentes da violência e
exploração sexual. Sobre esse caso em específico, e sobre outros semelhantes, algumas
questões são fundamentais para que se compreenda bem direitinho o quão revoltante
é essa decisão. Primeiro que o uso do termo prostituição em referência à
crianças e adolescentes é inadequado, a expressão correta é “exploração sexual
infanto-juvenil”
“Não é correto porque a palavra ‘prostituição’ remete a idéia de consentimento,
o que não ocorre quando uma criança ou adolescente é envolvido em um ato sexual
ou pornográfico. Toda vez que isso acontece, caracteriza-se uma situação de
exploração sexual, na qual eles e elas são vítimas e em que seus direitos
fundamentais estão sendo violados. A maneira correta de se referir a esses
casos é o termo ‘exploração sexual comercial de crianças e adolescentes’. Quando
crianças e adolescentes são levados a participar de atos sexuais ou
pornográficos, estão sendo explorados sexualmente e induzidos a essa prática,
seja por situação de pobreza, abuso sexual familiar, estímulo ao consumo ou
quaisquer outras situações de vulnerabilidade pessoal ou social. A
palavra ‘prostituição’ remete à ideia de consentimento, desviando o enfoque da
exploração sexual. Ou seja, retira a criança e o adolescente da condição de
vítimas, transportando-os para o papel de agentes da situação. Para melhor
descrever esses casos, o correto é usar o termo exploração sexual comercial
infanto-juvenil.” ANDI.
Mas pra quem não compreende
as causas da existência da exploração sexual infantil pode compreender a partir
de uma matéria publicada no Brasil Escola nos ajuda a compreender um pouco
sobre essa realidade.
“A despeito de todos os esforços do Estado no enfrentamento deste
problema, há a permanência de uma realidade hostil para muitas crianças –
principalmente meninas – nas regiões mais pobres do país: segundo a UNICEF, em
dados de 2010, cerca de 250 mil crianças estão prostituídas no Brasil. De forma
geral, a [...] exploração sexual de uma criança a qual, por vários fatores,
como situação de pobreza ou falta de assistência social e psicológica, torna-se
fragilizada. Dessa forma, tornam-se vítimas do aliciamento por adultos que
abusam de menores, os quais ora buscam o sexo fácil e barato, ora tentam lucrar
corrompendo os menores e conduzindo-os ao mercado da prostituição. Os aspectos
facilitadores desta condição na qual se vê destruída a infância desconsideram
os direitos e a necessidade de proteção da criança. Para além das possíveis
vulnerabilidades decorrentes da situação socioeconômica - se não a principal
causa, certamente uma das mais importantes – estão outros aspectos como o
próprio gênero da criança, fato que explicaria uma maior vulnerabilidade das
meninas, tão expostas à violência contra a mulher até mesmo no ambiente
familiar. Isso sugere que são aspectos importantes para a compreensão da
violência contra a criança e outros para além daqueles ligados apenas às
questões de pobreza. A questão de gênero estaria intrínseca a um modelo
sociocultural que, por vezes, como no caso brasileiro, pode reproduzir uma
naturalização da discriminação contra a mulher (fruto de valores machistas),
vista como objeto destituído de valor, de consciência e liberdade.”
No dia 22 de maio deste foi
aprovada “a lei
que torna crime hediondo o abuso sexual de crianças e adolescentes. A pena
prevista para o crime, de 4 a 10 anos, não prevê a liberdade mediante o pagamento
de fiança, obriga os condenados cumprirão inicialmente a punição em regime
fechado. Para progressão de pena, o réu primário terá que cumprir no mínimo 2/5
e, os que forem reincidentes terão que cumprir 3/5.(Ministério do Turismo)
Segundo
a matéria publicada no G1 o crime pelo qual o fazendeiro estava sendo julgado,
e do qual foi absolvido, era pelo estupro de vulnerável, porque a idade da
garota mais nova era de apenas 13 anos. Em primeira instância, ele já teria
sido absolvido da acusação de favorecimento à prostituição, mas foi condenado a
oito anos por estupro de vulnerável. O Ministério Público recorreu da
absolvição. A 1ª Câmara Criminal Extraordinária do TJ-SP absolveu o fazendeiro
dos dois crimes.
“Apesar de reconhecer o
caráter da presunção de violência para o crime de estupro de menores de 14
anos, o relator do caso acolheu os argumentos da defesa de que o fazendeiro foi
levado ao erro pela menina por ser garota de programa e por sua experiência
sexual anterior. ‘Não se pode perder de vista que em determinadas ocasiões
podemos encontrar menores de 14 anos que aparentam ter mais idade, mormente nos
casos em que eles se dedicam à prostituição, usam substâncias entorpecentes e
ingerem bebidas alcoólica’, afirmou o acórdão. A presidente do Conselho
Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), Míriam Maria José
dos Santos, afirmou que o fazendeiro deveria ser punido por ter cometido um
crime de violação dos direitos da criança e adolescente. ‘Houve exploração
sexual de menor, o que é crime hediondo e ele deveria ter sido condenado’,
afirmou. Para Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a decisão do TJ é uma ‘espécie
de licença para exploração sexual das crianças e adolescentes’. ‘A partir de
agora em São Paulo qualquer abusador sexual pode explorar sexualmente crianças
e adolescentes e justificar que não sabia que eram menores de idade’, afirmou
Ariel de Castro Alves, fundador da Comissão Especial da Criança da OAB. De
acordo com o Conselho Tutelar da cidade, as adolescentes não eram garotas de programa
e sim usuárias de drogas’.” Portal de Notícias Net.
Não
encontro palavras capazes de dar dimensão a minha revolta. Não me entra na
cabeça que se possa absolver um criminoso a partir de uma justificativa tão
esdrúxula como essa. Mas, porque condenar um fazendeiro pela prática de violência
contra uma adolescente usuária de drogas e que também se “prostitui”? Afinal a
adolescente é usuária de drogas e está sendo explorada sexualmente por “livre e
espontânea vontade”. Já o fazendeiro (coitado!) foi induzido ao erro por
meninas, com 13 e 14 anos (mas que pareciam ter mais de 18), que ardilosamente
o seduziram. A culpa sempre é da mulher, mesmo que ela ainda possa ser
considerada uma criança. Vergonha desse nosso Judiciário.
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