segunda-feira, 23 de março de 2015

O valor da vida de uma mulher



Farkhunda | Foto: ReutersHoje, final de domingo, fui surpreendida com a notícia de que mais uma mulher foi morta por apedrejamento e pauladas.
O crime ocorreu em Cabul, Afeganistão, na última quinta-feira. Segundo informou o site da BBC, uma multidão, composta principalmente por homens, atacou a mulher com paus e pedras, espancando-a até a morte e ateando fogo em seu corpo em seguida. De acordo com relatos a polícia assistiu a ação, mas não fez nada para impedir o assassinato. As imagens do ataque, filmadas por celulares, circularam nas redes sociais em todo o mundo. 
Multidão espanca Farkhunda | Foto: AP
Testemunhas afirmaram que o grupo acusava a mulher de queimar uma cópia do Alcorão, o livro sagrado do islamismo. Entretanto, um funcionário do Ministério do Interior, encarregado de investigar o caso, disse não ter encontrado provas que confirmassem a acusação. "Farkhunda era completamente inocente", disse o general Mohammad Zahir à imprensa local. Segundo ele, 13 pessoas, incluindo policiais, foram presas. 
Enterro de Farkhunda em Cabul | Foto: AP
O funeral de Farkhunda, que ocorreu hoje, foi acompanhado por centenas de pessoas que seguiram em protesto exigindo que os criminosos fossem punidos. Rompendo com as tradições seu caixão foi carregado por mulheres, ativistas dos direito femininos e da sociedade civil, que choravam e gritavam "queremos justiça para Farkhunda". A função de carregar o caixão costuma ser desempenhada por homens. O irmão de Farkhunda disse à agência de notícias Reuters que ela se preparava para ser professora de estudos religiosos.
O site pontua que na maior parte do país as mulheres ainda sofrem discriminação e os ataques a elas frequentemente não são punidos. Como se no nosso país as agressões, os estupros e assassinatos de mulheres em grande parte não recebessem o mesmo tratamento. Como se aqui também não estivéssemos sob o ataque de religiosos fundamentalistas que se empenham em restringir os direitos das mulheres.
Ativistas em enterro de Farkhunda | Foto: Reuters
Não há como não se indignar e não se comover com uma barbaridade dessa dimensão. Da mesma forma, não podemos perder de vista que enquanto mulheres, mesmo que brasileiras, eu e você, somos particularmente atingidas com esse tipo crime. Porque a banalização da vida da mulher faz parte de uma ideologia, de uma cultura universal. O machismo enquanto cultura usa da violência para nos intimidar. Para que através do medo silenciemos, retrocedamos.
Resultado de imagem para fanático religiososEntretanto, não vamos nos calar, não recuaremos, não cederemos. Não vamos aceitar que a igreja, através dos fundamentalistas ou não, nos impunha medo. A morte da afegã não conseguiu amedrontar as mulheres de Cabul – como também não nos amedrontarão Feliciano, Silas Malafaia e outros – pelo contrário, suscitou nelas a sororidade e a unidade de luta. Esperamos que a ruptura com a tradição dos homens carregarem caixões as impulsionem a romper com tantas outras barreiras que as oprimem e limitam.
Por aqui, espero sinceramente que a gente reflita sobre a expansão da bancada evangélica no congresso e a sua crescente influência, porque é exatamente sobre as mulheres que a força da ideologia da fé machista recai. É exatamente a vida das mulheres que corre riscos quando o fundamentalismo religioso toma conta e governa a nação.
Sinto-me profundamente entristecida com o assassinato de Farkhunda, não tenho como dimensionar a dor e a indignação que sinto ao saber que mais uma mulher foi morta de forma tão brutal e leviana. Espero que, de alguma forma, as irmãs que estão no Afeganistão lutando por justiça e reivindicando direitos para as mulheres sintam a força e a energia que as estamos enviando.
Resultado de imagem para fanático religiosos
Nós mulheres, bem como Estado brasileiro, não podemos deixar anunciar nosso repúdio a esse crime brutal. O Governo tem a obrigação de manifestar-se publicamente diante de tamanha barbaridade e violação aos direitos das mulheres. Presidenta Dilma, não deixe de mostrar ao mundo que não coadunamos com a violência contra uma mulher sequer.    


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