domingo, 1 de março de 2015

Aborto: o que não te falam


Semana passada circulou na mídia notícia informando sobre a prisão de uma jovem cabeleireira, moradora de Diadema (São Paulo), em decorrência da realização de um aborto.  Após atender a cabeleireira de 19 anos, que já tem um filho de 04 anos e constatar que a jovem havia provocado o aborto o médico Mahmud Daoud Mourad, decidiu chamar a polícia. A denúncia e detenção ocorreram no último dia 16.

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A acusada estava grávida de quatro meses quando resolveu ingerir 04 comprimidos abortivos depois do namorado tê-la abandonado ao ser informado que ela estava grávida.  Logo que começou a passar mal, por conta da medicação, ela foi levada ao hospital onde acabou fazendo uma curetagem.  A jovem permaneceu internada por 24 horas, tendo alta na terça-feira. 

Resultado de imagem para pelo abortoFelizmente, ela permaneceu detida apenas no hospital, não foi levada para a prisão. No entanto, enquanto permaneceu no hospital foi vigiada por dois policiais. Depois de receber alta ela foi liberada após pagar fiança de R$ 1 mil pelo crime de aborto. Apesar de estar em liberdade e poder responder pelo aborto em liberdade ela ainda corre o risco de pegar até três anos de prisão.
Em entrevista, divulgada no site O Globo ela declarou “Só desejo sumir. Você se sente muito exposta. Não sou contra nem a favor do aborto. A decisão de uma mulher interromper uma gravidez já é muito difícil por si só. Ser tratada como uma criminosa, responder a um processo. Estou muito assustada.”
Somente em 2014, conforme levantamento feito em 22 unidades da Federação, 33 mulheres foram presas por conta do crime de aborto. Parte das denúncias que levaram as gestantes à prisão no ano passado tiveram a mesma origem: os hospitais.
No dia 17 de junho de 2014 uma mulher de 22 anos, procurou o Hospital Municipal do M’Boi Mirim, na zona sul São Paulo, com queixa de fortes dores abdominais. Ela havia ingerido uma medicação para provocar o aborto. Estava no quarto mês de gestação. Como não tinha condições financeiras para procurar uma clínica aborto acabou optando pelos comprimidos.  A médica que atendeu a moça também resolveu denunciá-la à polícia. “Fiquei algemada na cama por três dias”, desabafou a acusada.
Resultado de imagem para pelo abortoSegundo reportagem publicada site Exame.com “As prisões por aborto ilegal no Brasil se concentram no Sudeste. O Rio tem 15 presas, São Paulo, 12, e Minas, uma. As demais denúncias foram registradas no Paraná (3) e no Distrito Federal (2). Acre, Maranhão, Rondônia, Tocantins e Roraima não informaram o número de denúncias. Todas as mulheres foram enquadradas no artigo 124 do Código Penal, de 1940, que criminaliza o aborto. A pena pode variar de um a três anos de detenção. Os perfis das rés têm semelhanças: jovens, negras, com pouca escolaridade e baixa renda.”
Resultado de imagem para debora blockComo sempre faço questão de salientar a penalização pelo crime de aborto, seja através da prisão, danos à saúde ou morte, alcança majoritariamente as mulheres pobres e, mais ainda, as negras. Em declaração recente Débora Bloch revelou ter feito um aborto. “Quando tinha uns 20 anos, engravidei sem querer de um namorado e abortei. Meu ginecologista me indicou uma clínica. Não tive nenhum tipo de arrependimento depois”. Ela é uma, dentre muitas outras mulheres, que não foi penalizada porque suas condições financeiras lhe permitiu ser devidamente assistida. Enquanto, isso, mulheres pobres continuam sendo marginalizadas ou morrendo por optarem pela interrupção da gravidez.
Apesar de se tratar de crime, o profissional de saúde está impedindo de comunicar ou denunciar a polícia qualquer mulher atendida por ele que tenha espontaneamente abortado ou provocado aborto.  Aquele que denuncia ou comunica aborto a polícia está desrespeitando o sigilo médico, além de violar o Artigo 154 do Código Penal. 
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5. ÉTICA PROFISSIONAL DO SIGILO PROFISSIONAL
Diante de abortamento espontâneo ou provocado, o(a) médico(a) ou qualquer profissional de saúde não pode comunicar o fato à autoridade policial, judicial, nem ao Ministério Público, pois o sigilo na prática profissional da assistência à saúde é dever legal e ético, salvo para proteção da usuária e com o seu consentimento.
O não cumprimento da norma legal pode ensejar procedimento criminal, civil e éticoprofissional contra quem revelou a informação, respondendo por todos os danos causados à mulher.
Art. 154. Código Penal: É crime: “revelar a alguém, sem justa causa, segredo de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem”.
Portanto, além de responder criminalmente, o profissional também pode responder processo civil de reparação de danos, o que pode leva-lo a ter de pagar indenização à mulher por ele denunciada.
Resultado de imagem para sigiloA quebra de sigilo médico paciente, em específico sobre aborto, pode tornar as consequências de procedimentos mal sucedidos, que hoje já é um sério problema de saúde pública, num verdadeiro genocídio, já que o medo de ser denunciada pode impedir que as mulheres busquem por ajuda. As denúncias podem amedrontar, inclusive, vítimas de aborto espontâneo, que se sentirão receosas de serem injustamente acusadas e presas por aborto.  

Quantas Jandiras precisarão ser assassinadas para que parlamentares compreendam que saúde pública não se regula com fundamentalismos religiosos? Quantas mulheres precisaram ser coagidas a maternidade compulsória por conta do medo de serem presas, responderem a processo, terem suas vidas devastadas simplesmente por ignoramos o fato de que maternidade deve ser um ato de amor, voluntário e consciente?
Resultado de imagem para pelo abortoAté quando vamos ignorar o fato de que muitas mulheres que se submetem a abortos inseguros mesmo sendo crime e tendo ciência de que estão se arriscando a perder a vida e deixar seus filhos órfãos? Mulheres que optam pelo aborto não precisam enfrentar processo e ou serem presas. Precisam de acolhimento, precisam de cuidados, inclusive médicos e psicológicos. É dever do Estado resguardar a vida de milhões  de mulheres que submetem anualmente a procedimentos abortivos e se arriscam a se converterem em mais uma vítima fatal entre as centenas que morrem em decorrência de procedimentos mal sucedidos.
Resultado de imagem para pelo abortoEm meio a esse problema que, ao que tudo indica, tende a se agravar, um paliativo pode amenizar o sofrimento de quem atualmente está enfrentando processo criminal por aborto no nosso país. O Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (Cladem), coordenado no Brasil pela advogada Gabriela Ferraz, está identificando as mulheres presas por este crime no País para prestar assessoria jurídica gratuita. 
Enquanto isso, o presidente da Câmara, o Deputado evangélico Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que recentemente realizou culto evangélico na Câmara – ferindo princípios constitucionais – esbraveja  “Aborto e regulação da mídia só serão votados passando por cima do meu cadáver”. Essa declaração é uma clara ameaça de que durante o seu mandato podemos supor que haverá boicote a qualquer intensão de avanço no tocante ao aborto e os direitos reprodutivos femininos. Na verdade, acho que é provável que projetos de lei que visem restringir direitos ou caçar alguns já conquistados sejam postos em pauta, como por exemplo, “O Estatuto do nascituro” Ou o “bolsa estupro”.
O mínimo que se espera num momento crítico como esse, em que a bancada evangélica fundamentalista vem crescendo e tomando força dentro dos espaços de decisão política do país e se convertendo numa ameaça de retrocesso, é que se puna exemplarmente, inclusive com cassação, os profissionais que vem desrespeitando o Código de Ética Médica e o Código Penal e denunciando mulheres que recorrem aos serviços de saúde a procura de socorro médico.


1 comentário:

Anónimo disse...

Triste momento o qual nós vivemos, antigamente era uma honra às mães, dar a vida para salvar o próprio filho, atualmente querem o direito de mata-lo