segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Violência, obstetrícia, obstétrica ou no parto.




Por Ana Eufrázio
O que é violência obstétrica, obstetrícia ou no parto?    

A violência obstétrica pode ser definida como as manifestações que provocam dor, constrangimento, discriminação ou a violação aos diretos da gestante e do recém-nascido na ocasião do parto.

Pode parecer surreal falar sobre violência cometida durante o parto, entretanto, isso ocorre com enorme frequência. Através dos relatos que esporadicamente escutamos temos uma breve noção do que seja violência obstétrica. Quem nunca ouviu uma mulher contar que, na hora do parto, os médicos e enfermeiras mandam as parturientes pararem de reclamar já que na hora de fazer as crianças essa não choraram? Ou que tiveram de andar até a sala de parto se acabando de dor e até mesmo proibiram a entrada de um parente?

Essas situações são tão comuns que a gente nem encara como violência. Entretanto, essas atitudes são as mais comuns formas de humilhações e agressões à parturiente, como também são violações aos seus direitos e se caracterizam como violência obstétrica. Naturalmente, se essas fossem as formas mais graves de violações já seriam inadmissíveis. No entanto, os casos de brutalidade contra a parturiente e o nascituro atingem níveis impensáveis de crueldade. E essa crueldade é cometida por aquelas mesmas pessoas que são contra o aborto e a favor da vida, que defendem a gravidez até em caso de estupro, pois, a criança não pode ser penalizada, que acham que a gravidez e o parto dádivas de Deus...

Quem ainda não esta familiarizado com o assunto pode se chocar com os relatos de casos de negligencia, desrespeito, agressões e humilhações cometidos durante o parto, mas até pra quem já estuda o assunto eles podem se chocantes sim. Abaixo há um apanhado de dados e relatos que foram coletados por Ana Carolina A. Frazon e Lígia Moreira Sena. Elas contaram com a colaboração de 74 blogueiras na realização da pesquisa com suas leitoras. Ao todo, 1966 mulheres realizaram o “Teste informal de avaliação do atendimento obstétrico”.  Através de respostas anônimas dadas entre 08 de março a 15 de abril de 2012, as mães avaliaram seus partos.



Um dado alarmante, 47% das mães responderam que sofreu algum tipo de violência obstétrica e 57% teve medo pela sua saúde ou do bebê, se sentiu ameaçada ou deixou de perguntar alguma coisa por medo da reação dos profissionais envolvidos. Das entrevistadas, 55% não foi consultada a respeito de todos os procedimentos realizados durante o parto e em somente 47% dos casos, a parturiente teve acompanhante em toda estadia no hospital. 

Logo após o nascimento, ainda na sala de parto, antes dos primeiros cuidados com o bebê, 52% das mães não tiveram contato com o bebê, apenas o viram. 17% se sentiram com raiva porque se sentiu vulnerável e achou que foi mal atendida, e 31% se sentiram frustrada porque o parto e nascimento não transcorreram como planejado.

Logo abaixo, alguns depoimentos:

Contaram piadas na sala de ultrassom e não diagnosticaram o problema, meu bebê morreu.”

 “A medica afirmou que o bebê nasceria com deficiência sem razão do meu excesso de peso e idade. E que eu teria eclampsia e morreria”

“Disse que ia degolar meu bebê e fazer a cesariana, caso eu não concordasse em ir pra sala”

“Bateram nas minhas pernas, quando a minha filha havia ‘coroado dizendo’ que se eu não tivesse força, mataria a minha filha sem ar.”

“Médico fez episiotomia preventiva, eu senti o corte e perguntei se ele estava me cortando, ele negou. Estava com 8-9cm de dilatação e não fui amparada para subir na maca. Questionei se deitada era a única possibilidade e eles afirmaram que sim, tinha que ser deitada. No meio de uma contração a enfermeira estava colocando o acesso, eu contraí o braço e jorrou sangue. Quando eu vi o que tinha acontecido ela disse que me desculpava pela sujeira que eu tinha feito. O médico mandou a enfermeira me colocar no ‘soro’ eu falei que não precisava de ‘soro’, leia-se ocitocina sintética, pois o bebê já estava empurrando, mesmo assim colocaram o acesso.”

“Fui chamada de gorda, não fui ouvida ao apontar a melhor veia pra por o soro, o que levou a estourarem 7 veias, para depois pegar a veia que eu havia apontado, pedi PN, falei que meu bebê não era grande, que eu é que era, mas sequer fui ouvida.. era como se eu não estivesse ali.”

“Nos chamavam de éguas e que na hora de fazer o filho ninguém tinha pedido ajuda”

Você é vitima de violência obstetrícia quando:

- Lhe impedirem de ser acompanhada por alguém de sua preferência, familiar de seu círculo social.

- For tratada em trabalho de parto de forma agressiva, não empática, grosseira, zombeteira, ou de forma humilhante.

- Tratada de forma inferior, dando-lhe comandos e nomes infantilizados e diminutivos, tratando-a como incapaz.

- For submetida a procedimentos dolorosos desnecessários ou humilhantes, como lavagem intestinal, raspagem de pelos pubianos, ou for deixada em posição ginecológica com portas abertas.

- For impedida de se comunicar com o "mundo exterior", tirando-lhe a liberdade de telefonar, usar celular, caminhar até a sala de espera ETC.

- Fazerem graça ou lhe recriminarem por qualquer característica ou ato físico como por exemplo obesidade, pelos, estrias, evacuação e outros.

- Fazerem graça ou recriminarem por qualquer comportamento como gritar, chorar, ter medo, vergonha etc.

- Fizerem qualquer procedimento sem explicar antes o que é, por que está sendo oferecido e acima de tudo, SEM PEDIR PERMISSÃO.

- Lhe submeterem e/ou o bebê a procedimentos feitos exclusivamente para treinar estudantes e residentes ou a mais de um exame de toque (ainda assim quando estritamente necessário), especialmente por mais de um profissional, e sem o seu consentimento, mesmo que para ensino e treinamento de alunos.

- Derem hormônios para tornar mais rápido e intenso um trabalho de parto que está evoluindo normalmente.

- Cortarem a vagina (episiotomia) quando não há necessidade (discute-se a real necessidade em não mais que 5 a 10% dos partos). Dar um ponto na sutura final da vagina de forma a deixá-la menor e mais apertada para aumentar o prazer do cônjuge ("ponto do marido").

- Subir na barriga para expulsar o feto (manobra de Kristeller - foto abaixo).
Manobra de Kristeller (pressão no fundo do útero)

- Permitirem a entrada de pessoas estranhas ao atendimento para "ver o parto", quer sejam estudantes, residentes ou profissionais de saúde, principalmente sem o consentimento prévio da mulher e de seu acompanhante com a chance clara e justa de dizer não.

- Fazer uma mulher acreditar que precisa de uma cesariana quando ela não precisa, utilizando de riscos imaginários ou hipotéticos não comprovados (o bebê é grande, a bacia é pequena, o cordão está enrolado).

- Submeterem a uma cesariana desnecessária, sem a devida explicação dos riscos que ela e seu bebê estão correndo (complicações da cesárea, da gravidez subsequente, risco de prematuridade do bebê, complicações a médio e longo prazo para mãe e bebê).

- Dar bronca, ameaçar, chantagear ou cometer assédio moral contra qualquer mulher/casal por qualquer decisão que tenha(m) tomado, quando essa decisão for contra as crenças, a fé ou os valores morais de qualquer pessoa da equipe, por exemplo: não ter feito ou feito inadequadamente o pré-natal, ter muitos filhos, ser mãe jovem (ou o contrário), ter tido ou tentado um parto em casa, ter tido ou tentado um parto desassistido, ter tentado ou efetuado um aborto, ter atrasado a ida ao hospital, não ter informado qualquer dado, seja intencional, seja involuntariamente.

- Submeterem bebês saudáveis a aspiração de rotina, injeções e procedimentos na primeira hora de vida, antes que tenham sido colocados em contato pele a pele e de terem tido a chance de mamar.

- Separar bebês saudáveis de suas mães sem necessidade clínica. Dentre outras não constantes aqui mas que se enquadrem nas definições acima. (Lista obtida a partir da postagem Violência obstétrica By Ana C. Duarte)

Então, como fazer pra impedir que este tipo de violência continue sendo cometida?

Somente é possível cessar a cultura da violência obstetrícia através de divulgação dessas práticas, para que as mulheres possam se prevenir contra elas. Mas o principal mecanismo de combate a violência é denuncia. Não podemos nos calar diante desse descalabro.

Denunciar:

Para denunciar você vai precisar do prontuário, exija o seu no hospital, você tem direito de receber cópias que devem ser entregues sem questionamentos e custos.

Escreva uma carta contando em detalhes que tipo de violência você sofreu e como se sentiu e coloque o nome da equipe médica que lhe atendeu. Anexe à carta uma cópia do seu prontuário como prova dos procedimentos realizados e da participação da equipe que você esta denunciando. Envie para a Ouvidoria do Hospital, com cópia para a Diretoria Clínica, para a Secretaria Municipal de Saúde e para a Secretaria Estadual de Saúde, caso o parto tenha ocorrido no SUS. 

Se o seu parto foi realizando em hospital da rede privada, envie sua carta para a Diretoria Clínica do Hospital, com cópia para a Diretoria do seu Plano de Saúde, para a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) e para as Secretarias Municipal e Estadual de Saúde. 

Envie também uma copia da carta ao Conselho Regional de Medicina da sua região, peça a protocolação deste documento e guarde esses números. Você poderá ser chamada posteriormente pra prestar depoimento.  

Dependendo da gravidade e dos danos ocorridos, existem outras instâncias de denúncia e a possibilidade de cobrança de danos aos responsáveis (hospitais, médicos, governo plano de saúde). Nesses casos, seria ideal que você consulte e/ou constitua advogado.
Boa sorte!
http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/3/30/Pregnant_woman_%282%29.jpg?uselang=pt-br
Fontes: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/3/30/Pregnant_woman_%282%29.jpg/600px-Pregnant_woman_%282%29.jpg

 http://luciana.misura.org/2013/02/25/o-que-e-a-violencia-obstetrica-e-como-voce-pode-ajudar-a-acabar-com-ela/
https://www.dropbox.com/s/vwkvsxunteqtf13/Resultados%20Teste%20da%20Violencia%20Obstetrica.pdf



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